quarta-feira, 13 de março de 2013

O "Eu" que Precisa Viver




Toda vez que desejo mergulhar em uma leitura para acalentar a alma, leio Eliane Brum. Na minha percepção, ela é uma jornalista da alma. Seus textos transbordam a mais encantadora empatia, leveza e ao mesmo tempo, profundidade na forma de narrar as verdades da vida. Ao deparar-me com esse trecho de um texto seu na revista Época online, só reforcei ainda mais meu sentimento em relação à nossa triste surdez enquanto pessoas e sociedade:

“Os sons, quando se repetem dia após dia, nos ensurdecem. E a primeira voz que deixamos de escutar é a nossa...Ser surdo a si mesmo é uma surdez sem nenhuma deficiência auditiva, mas muito, muito triste. O que chamamos de silêncio, afinal, talvez seja apenas a nossa voz".


Essa citação da jornalista me instiga. No meu silêncio gritante, fico pensando o quanto estamos surdos. A afirmativa pode ser observada no nosso trabalho, nas nossas carreiras, na condução das nossas vidas pessoais, enfim, na nossa participação no mundo enquanto seres humanos singulares que somos.

Vivemos tentando fugir, na busca de significado nas coisas, mas na verdade, esse escapismo nos afasta para cada vez mais longe de nós mesmos.  Podemos ilustrar esse fato com tantas coisas que presenciamos, não é mesmo? Fico pensando nas histórias que ouço e nas situações que observo com mais frequência e me vem a cabeça no momento, a quantidade de pessoas que buscam ajuda nos remédios. Basta olharmos os números ($$) da nossa indústria farmacêutica para vermos o quanto a busca da cura se dá nos fatores externos e não no próprio eu.

Assistimos a tantas pessoas com depressão, tristezas, transtornos, se afundando nos remédios faixa preta. Mas, por que a depressão e tristeza tomam conta de tantos seres?  Será que o remédio esta dando voz ou ensurdecendo as pessoas para o seu verdadeiro eu?

Se formos por uma linha mais tênue de tratamento para os males modernos, encontramos milhares de pessoas buscando a terapia. Mas a pergunta que grita é: por que tanta terapia, tanta busca de algo para dar sentido?  Não é a evidência de que estamos esfacelando nosso eu? Na verdade, o que buscamos nela, é apenas dar voz ao nosso interior, ou seja, a nós mesmos.

O que é a terapia senão a permissão para o despertar mais vivo de nós mesmos? Ela é a fresta que abrimos para nossa autenticidade se apresentar. É a voz que negamos todo dia.  A percepção que cegamos com as agulhas que a sociedade nos impõe. O que não estamos vendo, é que a maioria dos nossos males se dá em função da negação da nossa singular existência.

Infelizmente, se não nos darmos conta de que os tormentos que vivemos se dão em virtude de estarmos surdos para nós mesmos, a terapia será apenas uma cadeira de rodas para locomovermos o verdadeiro ser que mora dentro de nós até a sacada para ver o sol e depois reconduzi-lo para dormir profundamente.

 Não precisamos dos remédios, pois os mesmos nos ensurdecerão ainda mais na sonolência da inércia de aceitar viver um padrão que nos pregam e não o que realmente somos e queremos para nossas vidas. Eles nos amortecerão profundamente no esquecimento de nós.

A terapia será apenas um escape momentâneo se nosso eu não for alimentado ao ponto de encher-se de coragem para quebrar o grosso invólucro que o oculta e assumir sua própria existência.

Necessitamos  ressuscitar nosso eu enterrado por um paradigma de vida que não nos cabe pelo simples fato de sermos, cada um de nós, uma singularidade que não suporta essa padronização louca  e modelo de vida único de sucesso que nos impõe o mundo.

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