Pela primeira vez na história, o mundo inteiro parou,
e o inimigo é tão intangível e abstrato quanto a mensagem que está implícita em
sua ocorrência. Esperava-se, cada vez mais, a convivência e gestão de crises,
oriundas das catástrofes naturais, que com sua força, deixam a marca física da destruição,
porém, apesar disso, não desencadeiam, em grande escala, um profundo despertar
do homem, para a consequência das suas ações. Então veio um vírus, para
imobilizar o corpo, e tentar aflorar as
mentes humanas para o que de fato é essencial : reconectar-se com a vida.
Nunca estivemos tão conectados por aparelhos, e
igualmente, desconectados com nosso ecossistema, que nos garante a vida. Esse
paradoxo, há tempo, vem dando sinais de sua insustentabilidade, porém,
insistimos, cegamente, em seguir. Esquecemos, em nosso desenfreado tear pelo
desenvolvimento e consumismo, que somos parte do que destruímos. Em cada avanço
sobre a natureza, em suas diferentes manifestações, o fio invisível que dá sustentação
à vida humana, é cortado.
A atual pandemia está intrinsecamente ligada à destruição
da natureza, sobretudo, ao desrespeito e crueldade com a vida animal. Derrubamos
as florestas, matamos os animais e seus habitats, e aos que restaram, obrigamos
a aproximarem-se cada vez mais da miséria e da turbulência da vida humana. Achamo-nos
supremos, poderosos, não importando-nos mais com o semelhante, nem com as inúmeras formas de
existência além de nós. Matamos e maltratamos os outros seres vivos, com
requintes de crueldade, ignorando sua dor e sofrimento. E nesse inescrupuloso modo de ser, invisivelmente
cortamos a teia que nos conecta e sustenta à vida. Assim, de repente, e
provavelmente, um morcego parou o mundo.
Mas não foi por acaso! O coronavírus foi apenas o
esfacelar de um vidro, cheio de rachaduras, que há décadas, ou séculos, vinham trincando.
Agora, mais do nunca, precisamos, e
temos tempo, para (re)pensar, (re)significar, (re) tomar outro rumo para a
nossa frágil (co) existência, bem como, para
o mundo. O Covi-19 não tem face, não tem
corpo. Ele reside e resiste no abstrato,
e é nessa arena que podemos e devemos (re)construir nossas vidas, assim como, (re) considerar a complexa teia que nos
envolve e nos equilibra. Sob essa égide,
será vital resgatarmos a solidariedade e o olhar humanizado pelo outro, pois aprendemos
agora, sob dura pena, que a ação do meu semelhante pode frear ou alavancar a epidemia.
Nunca precisamos tanto do outro, tampouco, do equilíbrio com a natureza, para retomarmos a vida.
Estamos profundamente presos à inúmeras conexões ocultas.
Nossas ações, embora muitas vezes imperceptíveis, provocam uma reação em cadeia,
por todo elo que nos emanta, e que consequentemente é a base da vida terrestre.
Já temos pesadas evidências, entre elas, gripe aviária, HIV, gripe suína, e
agora o coronavírus, de que nossas (des)conexões caminham ao sentido contrário
da sustentabilidade do planeta. Mas , apesar de tudo, ainda há tempo, ou melhor,
chegou o tempo, de (re)conectar para o essencial. E aqui, para finalizar, deixo
uma citação de um dos autores, que , há muitos anos, embasam minha forma de
perceber o mundo, e, que ao meu ver, deveria
ser leitura obrigatória , em especial
nessa época, para desabrochar e abrir as mentes para um novo e urgente tempo:
Edgar Morin.
Segundo o autor, (2007,
p. 64):
a relação do ser humano com a natureza e o
planeta não pode ser concebida de um modo redutor nem separado, como se
depreende da noção de globalização, porque a Terra não é a soma de elementos
disjuntos: o planeta físico, mais a biosfera, mais a humanidade; a relação
entre a Terra e a humanidade deve ser concebida como uma entidade planetária e
biosférica.
2 comentários:
Sua visão sobre o atual momento do planeta mostra sua capacidade de empatia em uma realidade tão polarizada (covid-19 é mortal ou é bobagem), claramente justificada pela polarização política, especialmente no Brasil (os mais a direita querem ir pra rua e os mais a esquerda querem o lockdown).
Quem poderia pensar que tudo pode ser uma manipulação política e econômica da gigante China que não mais que duas décadas atrás era origem de produtos de má qualidade e fonte de produtos do comercial informal, vulgo camelôs e hoje dita as regras da economia e da polític global.
Que nossa esperança jamais se perca, influenciada por seu olhar doce e sincero de um desejo que dias melhores virão.
Obrigada por expor sua visão, muito lúcida, deste amargo momento. Que possamos, mais adiante, quando a pandemia se aniquilar, e à luz de toda lucidez, sem paixões e ideologias, (re)construir nossa realidade, considerando os ensinamentos mais profundos e subjetivos, que esse momento nos deixa. Um grane abraço, e mais, uma vez, muito obrigada por contribuir com seu olhar !
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